Uma revolução a laser
A estreia do som digital no rádio brasileiro, pioneirismo da Morena FM, rendeu alguns problemas e causos. Uma coisa que a gente descobriu logo de cara é que não existia estantes para CD, tivemos que desenhar uma e encomendar a um marceneiro.
Outra foi o impacto do som digital nos aparelhos das casas. Tudo o que existia antes, no analógico (LPs e cassette) estava limitado a frequências de som entre 100 (o som mais grave) e 12.000 hertz (o som mais agudo), isso usando agulhas e cápsulas de qualidade.
Os microsystens das casas tinham essa mesma limitação, mesmo os mais caros. Já o transmissor de uma FM sempre conseguiu entregar de 16 a 30.000. Já o CD usa desde 10 hertz (grave muito mais forte que o analógico) até 40.000 hz (um super agudo).
O resultado dessa salada toda foi que, assim que a gente passou a usar CDs na Morena FM, centenas de caixas de som nas casas e nos carros estouraram, por não aguentar as novas frequências. Por outro lado, as pessoas passaram a ouvir instrumentos que nem sabiam existir nas músicas.
A Morena FM começou a usar CDs normalmente em dezembro de 1990 com o lançamento do programa Expresso 98, feito com CDs importados dos EUA com gravações inéditas e exclusivas. Mas antes, no Natal de 1988, uma ousadia...
Eu tinha trazido da Europa um especial sobre os Beatle de quatro horas, todo em inglês, em CDs, além de um tocador da Sony que ainda não existia no Brasil. Não resisti e, naquele Natal, a Morena FM transmitiu o primeiro programa digital do país. Difícil foi a galera entender o inglês...
Um problema que chateava era só conseguir lançamentos internacionais em CD, importados. Só a partir de 1991 os nacionais passaram a ser lançados tanto em LP quanto em CD e a gente pode começar a trocar todo o acervo para digital.
Isso criava um abismo entre a qualidade das músicas estrangeiras (digitais) e as nacionais (analógicas). A diferença era tão grande que a gente passou a só usar um ou outro em cada bloco, sem misturar as duas tecnologias. A esta altura usávamos CDs duplos profissionais da Numark, como este da foto.
Em setembro de 1991 finalmente tínhamos trocado tudo. Escolhemos o Dia do Radialista e convidamos Tiro Seco, um dos locutores mais antigos ainda em atividade na época, pai de Beto Leite. Assim, com duas gerações de locutores, lançamos oficialmente a programação “100% laser”.
Depois de resolver a diferença entre os discos analógicos e digitais, restava mais uma coisa sem solução. Quando a música terminava e entravam os comerciais, analógicos, era como mudar de um canal de TV em 4k para um preto e branco antigo.
A solução só chegou também em 1991, com um aparelho recém lançado nos EUA, que eu tive que importar debaixo de muita burocracia, o Digicart II PLus. Ele gravava com qualidade acima de CD e a gente “baixava” para que ficasse igual. Mas nem tudo ficou bom.
Os comerciais gravados na própria Morena FM, digitais, criavam um contraste horrível com os enviados por agências de propaganda nacionais, que só conheciam rádios analógicas. Foi preciso muita insistência e demonstrações para que entendessem como seus clientes eram prejudicados.
Levou ainda dois anos para que passassem a enviar materiais com qualidade digital. Hoje, os CDs cederam o lugar aos PCs e às faixas em mp3 (gravadas sempre com 320kbps de qualidade), as agências enviam os comerciais por e-mail e não precisamos mais de estantes no estúdio.
Na semana que vem, quando a Morena FM completa seus 30 anos (6 de dezembro), vou falar um pouco da equipe que faz a melhor rádio da Bahia. Até lá, visite www.morenafm.com
A rádio Morena FM 98 completou 30 anos em dezembro de 2017, por isso seu fundador, Marcel Leal, conta aqui a história e as estórias da rádio mais ousada da Bahia.
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