entrevista
30.Maio.2015



Ronan Xavier, doutor em genetica

“40% das pesquisas na Uesc são de genética do cacau”
ronan xavier afirma o professor e doutor Ronan Xavier Correia, pesquisador de Genética Vegetal e assessor de Relações Internacionais da Universidade Estadual de Santa Cruz. Ronan se formou em Viçosa e depois foi para o Centre de Reserca em Agrigenômica em Barcelona, Espanha.
      Ele conversou com o jornalista Marcel Leal no programa Mesa Pra 2, da Morena FM (quartas, 15 horas) sobre genética vegetal, pesquisas, programas de intercâmbio e até sobre gafes que brasileiros cometem quando vão para o exterior. Confira.

ML - Onde você se formou inicialmente?
       RX - Me formei em Viçosa, no curso de Agronomia. Lá também fiz mestrado em Genética por dois anos e meio e o doutorado por mais quatro anos também na UFGM. Encontrei muitas pessoas da região, como o pesquisador da Embrapa Francisco Laranjeira.

E o que você fez em Barcelona?
       Fui pesquisar a genômica do melão, que é o estudo de todos os genes de uma espécie. Escolhi o melão por ser uma fruta de grande importância para o Nordeste e queria aprender algo de útil para a região de influência da Uesc, que é onde desenvolvo minhas pesquisas.
       É claro que não conseguimos estudar 20 ou 30 espécies de genes, por isso foquei no grupo relacionado à resistência do melão a doenças. O fruto tem muitos fungos e estudei o que confere a resistência a eles.

Você fez outra pesquisa de genética com o pau brasil?
       Sim, assim que cheguei à região, em 2000, encontrei Dr. Paulo Alvim e ele me disse que eu deveria estudar o pau brasil, já que não tinha ninguém interessado. Eu vim para criar programas de pós graduação na Uesc e precisava colocar espécies relevantes para a região, despertar o interesse.
       Estudei o pau brasil para conhecer o status de conservação genética da espécie. Como foi uma espécie muito explorada economicamente, nossa hipótese é de que haveria um declínio da variação genética. Houve cortes e as melhores foram embora.

No caso do jacarandá e do pau brasil houve alguma conclusão?
       No jacarandá encontramos algo fantástico. Nos cursos de Agronomia e Biologia, por exemplo, ensinamos sobre a preservação das espécies, como formar reservas biológicas e bancos. Encontrei uma fantástica no Instituto Pau Brasil, para onde, há uns 40 anos, técnicos levaram amostras de diferentes regiões da Bahia.
       A diversidade genética que encontramos num mesmo lugar representava a diversidade máxima. Quando analisávamos populações isoladas, elas tinham menos diversidade, mas no IPAB, representavam varias populações juntas. Eu não vi isso em nenhum lugar do Brasil.

E com relação ao pau Brasil, qual foi a conclusão?
       O que mais me empolga no estudo do pau brasil são os variantes morfológicos que existem na folha, na estrutura da madeira e na forma da arvore. Temos três variedades de pau brasil que chamamos de folha grande, media e pequena.

As três eram nativas?
       Sim, em Potiraguá, por exemplo, encontrei as três espécies na mesma mata. E é difícil encontrar isso. O que sei é que são tão diferentes entre si quanto espécies diferentes. O pau Brasil e a sibipiruna, que são parentes próximos, tem a mesma diferença entre si do que outra variante do pau brasil.

E a pesquisa com o cacau?
       É a principal pesquisa. 40% das pesquisas na área de genética na Uesc são de cacau, por ser uma planta de interesse imediato economicamente e por ter passado pelo declínio na década de 90 por dois motivos: o macroeconômico, na queda do preço e porque os cultivos não estavam com a diversidade genética preparada para suportar a entrada do fungo que causa a vassoura de bruxa.

Já existiam doenças como mela e podridão parda, mas a vassoura alcançou um nível absurdo...
       É, ela afeta a produção de duas maneiras. Primeiro deixando a arvore frágil porque drena as energias e diminui a produção, e diretamente no fruto, que fica imprestável para a produção.

O genoma do cacau foi todo mapeado?
       Temos o projeto do cacau bem como do fungo causador da vassoura de bruxa. Entre 2002 e 2004 fizemos um projeto envolvendo Unicamp, Embrapa, Ceplac. A Uesc ficou responsável por uma parte, a Ceplac por outra e nesse grande consórcio fizemos o sequenciamento do genoma do fungo moniliophtora perniciosa. Já no projeto do cacau foram dois consórcios internacionais.
       Pesquisadores da Uesc participaram juntamente com dois grupos, um americano, com sede em Miami e um francês, com liderança no serrado. Cada um publicou um resultado independente.

Como é feito esse mapeamento?
       Pega uma mostra de folha da planta, macera, coloca num aparelho, separa esse DNA, que é colocado em outra máquina. Ali é feita a leitura de todos os pares de bases nitrogenadas que compõem do DNA. Isso hoje é feito em uma única semana. Quando fizemos o projeto genoma do fungo foram dois anos para concluir a sequencia.

Foi mapeado o fungo e, a partir daí, se faz o que?
       Os pesquisadores começam a gerar hipótese de trabalho separando os genes, vendo como degrada as células das plantas, como bloquear esses genes. Ao fazer isso, se gera uma tecnologia de controle do fungo.
      Há patentes que foram depositadas mas não foram tornadas publicas porque tem que ser adquirida por uma empresa que possa transformar num produto imediato, o que não houve com o cacau. Houve facilidade na seleção de materiais, se conhece melhor os clones.

O café é semelhante ao cacau?
       É sim, e teve problemas de doenças sérias, como a ferrugem, em Minas. A broca do café, por exemplo, colocava o problema como o cacau aqui na região. Houve inclusive ações drásticas como a erradicação de lavouras para substituir por outras mais resistentes.

O cupuaçu e o cacau são “primos”?
       Sim, o nome do cupuaçu é teobroma grande floro e o cacau é o teobroma floro cacau. Eles têm frutos parecidos.

Qual a pesquisa que você faz hoje na Uesc?
       Continuo fazendo a pesquisa da resistência do melão, do cacau. No caso do cacau, a mesma doença, como continuidade do que começamos na Espanha em 2011.
      Precisamos estar vigilantes gerando novas combinações de genes, para que, quando o fungo conseguir suplantar a resistência dos cultivares atuais, já tenhamos identificado novas combinações que resistam a novas variações do patógeno, como a podridão parda e o mal do facão, no cacau. No melão é a resistência ao vírus.

Existe alguma pesquisa com insetos, como a formiga, por exemplo?
       Com insetos não, mas temos relatos que, quando o cacau está distribuído na floresta amazônica, por exemplo, tem material convivendo com a vassoura de bruxa e conseguindo sobreviver por causa do isolamento. Ambientes com maior equilíbrio ecológico sofrem menos com doença.

O clima influencia muito para isso?
       Sim, muito. A região cacaueira, por exemplo, é uma região úmida quase o ano todo. A cada mês chove 20 dias. Já na Amazônia existe um período seco definido. Isso quebra o ciclo de vida do patógeno e diminui a população desse patógeno.

Existe alguma maneira eficiente de fazer barreira sanitária nas fronteiras?
       A barreira sanitária tem que ter fiscalização por uma amostragem densa, para que seja efetiva. Nas fronteiras não pode ser uma a cada hora. É preciso o tempo todo, para pegar uma boa mostragem. A história da disseminação de plantas sempre foi por meio de transporte de carregamento.

Você sempre teve intenção de dar aulas ou gostou durante o curso?
       Durante o curso de Agronomia fiz estágio de docência na disciplina biologia celular. O professor dava aula e à tarde os alunos voltavam ao laboratório. Eu estava lá para tirar dúvidas, mostrar de novo a estrutura no microscópio. Eu tive essa relação com os colegas por causa da disciplina.
       Aprendi um pouco a arte de ensinar com essa relação como monitor. Ao terminar o curso, alguns colegas foram buscar emprego em empresas e eu decidir fazer mestrado e doutorado na área de genética. 80% dos que faziam isso na época fatalmente iriam ser professores universitários.

Quem ensina acaba aprendendo mais, não é?
       Claro. Hoje cada aluno que chega para mestrado fez uma pesquisa. Eu ensino a fazer o experimento e ele faz por conta própria a busca na literatura. Eu vou ajudá-lo a fazer esse experimento que permita responder a pergunta que ele faz.

Qual a maior dificuldade hoje na Uesc, para a pesquisa?
       Assim que chegamos na Uesc, fomos buscar a aprovação de projetos junto a órgãos de financiamento, como o CNPq e Caps. Após os anos 2000, foi fundada na Bahia a Fundação de Amparo á Pesquisa e fomos buscar esses recursos.
       Só que para fazer pesquisa precisava laboratório. A Uesc não tinha laboratório nem o estado tinha como prioridade construir. Fomos ao governo federal nos editais, demoramos 8 anos iniciais para construir essas duas coisas. É assim no país inteiro.

Vamos falar dos alunos que estudam fora. Qual o caminho que ele deve seguir?
       O estudante da Uesc, assim que ingressa no primeiro ano, deve tirar boas notas e aprimorar a língua estrangeira do país onde vai estudar um ano. Temos capturado bolsas de estudos no CNPq e na Caps para enviar 1% de nossos alunos para universidades em diferentes países.

As bolsas cobrem as despesas integralmente?
       As bolsas do Ciências sem Fronteiras cobrem os custos de vida no local, mas acompanhei situações em que o preço varia. O valor da bolsa para a Austrália é diferente, por exemplo, da Espanha.
       Na Alemanha, se estiver numa área central os preços variam em relação ao interior. O valor é bem estudado e não fica desassistido. Mas tem financiadores que não pagam a bolsa integral.

Existe matéria para quem vai viajar para o exterior não pagar mico? Quando você foi para a Espanha pagou algum?
       (risos) Bom... eu vi cenas interessantes com colegas que eram brasileiros. Em Viena, por exemplo, vi um grupo de brasileiros que para entrar no teatro tinha que pagar 1 dólar para guardar os pertences. A pessoa enfiava uma blusa na outra para pagar menos, mas o porteiro viu e disse que bastava deixar as blusas abertas que ele só iria pagar por uma.

Existe uma história na Alemanha que você me contou antes...
       Sim, as pessoas as vezes tem preconceito dizendo que o alemão é muito difícil. Mas quando assumi a Arint, na Uesc, trouxe uma professora alemã para fazer uma palestra motivacional. Dos 200 que assistiram alguns disseram que iriam aprender alemão em três meses, que era o tempo do edital.
       Colocamos três alunos inicialmente. Quebrei dois mitos: que não era difícil e que havia interessados. E a cada ano temos dois a três alunos estudando na Alemanha.

E na Espanha você teve alguma dificuldade na cultura local?
       Não. Achei o povo espanhol muito acolhedor. Mas as leis anti corrupção são mais avançadas. De Barcelona em si não tinha muita informação, mas o centro de pesquisa eu já tinha examinado e sabia que se tratava de um bem avançado na genoma do melão.

Seu curso era em espanhol?
       Metade deles era em inglês e metade em espanhol. As reuniões técnicas eram faladas em catalão, uma língua que você sente que ouve em francês, ora português ou até mesmo latim antigo.


 
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