19.Outubro.2002
"A cultura do cacau tornou as pessoas resistentes a mudanças"
constata Marcelo Mendonça, administrador de empresas, 56 anos, casado, três filhos, diretor do
Centro de Convenções Luís Eduardo Magalhães, em Ilhéus. Diante da dificuldade que encontra para
mudar hábitos e atitudes de comerciantes e prestadores de serviço ligados ao turismo, ele afirma que
essas pessoas, oriundas da solidão do empreendimento rural, "são muito auto-suficientes porque
antigamente você fazia tudo sozinho, plantava, colhia e vendia cacau."
E registra, em tentativas junto à Associação Comercial e à CDL de Ilhéus, certa frustração por não
conseguir convencer esse público a participar de um curso de relacionamento e boas maneiras. "Todos
acham que sabem tudo, quando na verdade ainda temos muito a melhorar para podermos conquistar uma
clientela maior," diz o dirigente.
Nesta entrevista Marcelo Mendonça é recorrente em demonstrar sua preocupação com a subida do nível
de qualidade dos serviços, sem o que Ilhéus não realizará o potencial de negócios de turismo que
possui. Não basta termos praias lindas porque isso existe em muitos outros lugares mas um
tratamento diferenciado para nossos clientes, insiste o diretor do Centro de Convenções.
A Região - Qual a importância do Centro de Convenções para os negócios do turismo em Ilhéus?
Marcelo Mendonça - Ele é de fundamental importância porque pode alavancar o turismo, ao oferecer
equipamentos que possibilitam a realização de grandes congressos para 1.500 a 2.000 pessoas, o que
seria inviável nos hotéis e pousadas. Nós temos também o pavilhão de feiras, onde já foi realizada
por exemplo, a Feira do Cacau; temos estacionamento, auditórios, salas e áreas livres. Por isso
somos o único local de Ilhéus que pode abrigar grandes eventos.
AR - E como está esse equipamento em comparação com os similares da Bahia?
MM - Dos três Centros Salvador, Porto Seguro e Ilhéus proporcionalmente nós temos obtido os
melhores resultados em termos de público, de uso e de recursos. Isso é um indicativo muito
significativo, mas não basta a cidade ter um local para realizar eventos se não estiver preparada
para receber as pessoas. Os empresários têm que ter a consciência de que irão receber um universo
de 1.500 a duas mil pessoas e devem recebê-las dignamente, com bons restaurantes, bons hotéis e mais
opções de lazer, principalmente à noite.
AR - Quais são as dificuldades que o senhor encontra com o empresariado local?
MM - Eu acho que o empresariado não é muito receptivo, ele não quer ser reciclado. A cultura do
cacau deixou essas pessoas resistentes a mudanças, muito auto-suficientes, porque antigamente você
fazia tudo, plantava, colhia e vendia o cacau. Então quando houve essa mudança, com a
vassoura-de-bruxa, tivemos que nos reciclar, precisamos nos reciclar...
AR - Quer dizer que há muita resistência?
MM - Pois é. Quando tentamos com a Associação Comercial e a CDL chamar os empresários para conversar
e dar um curso de relacionamento público e boas maneiras, todos acham que sabem tudo, quando na
verdade ainda temos muito a melhorar para podermos conquistar um público maior. Não basta termos
praias lindas, porque isso existe em muitos outros lugares; é preciso, sim, um tratamento
diferenciado para nossos clientes.
AR - E quais são os segmentos que recebem os benefícios mais imediatos do Centro de Convenções?
MM - As estatísticas da CDL e da Associação Comercial mostram que em dia de algum evento no Centro,
todas as pousadas, hotéis, restaurantes e locadoras até próximos a Olivença são beneficiados. Os
restaurantes das proximidades costumam ficar lotados, as locadoras de automóveis e os serviços de
táxi também são muito beneficiados, dentre outros setores do comércio. Mas é preciso que a cidade se
prepare para que nesses eventos ela tenha condições de atender bem a esse público.
AR - O senhor tem uma avaliação feita pelos clientes do Centro de Convenções? Qual a opinião deles?
MM - Já tivemos aqui formaturas, casamentos, festa de debutantes, embora o local não tenha sido
projetado para esse tipo de festas, mas nós o adaptamos e tem dado certo. Após o término de cada
evento costumamos a conversar com os promotores e com aqueles que locam nossos espaços, e para nossa
satisfação temos recebido muito mais elogios do que críticas. Mas as críticas também são bem
recebidas, pois sabemos que como equipamento novo, temos deficiências a sanar.
AR - Qual o tipo de evento mais freqüentemente realizado em Ilhéus?
MM - Como o Centro dispõe de equipamentos para que se façam grandes promoções, não se pode trazer
para cá eventos que não tenham um significado muito grande em torno da coletividade. Como exemplo
podemos citar a Feira de Informática, onde foi calculada uma média de mais de 10 mil pessoas
circulando.
AR - E que gênero de promoção atrai mais público?
MM - Normalmente aquelas que oferecem shows. O evento do Colégio São Jorge por exemplo, foi
encerrado com uma apresentação de Elba Ramalho, o que garantiu a presença de mais de 6 mil pessoas,
sem contar as 12 mil que circularam em outros dias. Já hospedamos shows que esgotaram a capacidade
do Centro, nos levando a fechar os portões para impedir a entrada de mais gente.
AR - Os principais clientes da Casa são da Bahia mesmo ou de outros Estados e do Exterior?
MM - Já tivemos eventos internacionais, com presença de ministros de Estado de países africanos,
dentre eles a Semana Internacional do Cacau, no ano passado, com cerca de 15 representantes de
outros países, além de vários congressos nacionais, estaduais e locais. Então podemos dizer que hoje
o Centro de Convenções abriga todos os segmentos econômicos, numa multiplicidade muito grande de
Estados que vêm fazer eventos aqui.
AR - O que muda dos eventos locais para os estaduais, nacionais e internacionais?
MM - O evento internacional, pelo envolvimento de personalidades, é mais restrito, mais qualitativo,
pois traz ministros, secretários, governadores, sendo portanto dirigido a determinado nível de
público. Já as promoções regionais são mais abertas, têm menos restrições. Mas em quase todos os
eventos que tivemos, usamos nossa capacidade máxima que é de 3 a 4 mil pessoas por dia.
AR - Qual o potencial de atendimento que o Centro de Convenções oferece atualmente?
MM - É preciso lembrar que nós temos vários espaços, um auditório com capacidade para 1.750 pessoas
sentadas, outro para 550, e mais 17 salas. Mas se formos levar em conta os números que giram em
torno disso, podemos constatar que circula por aqui uma quantidade muito grande de pessoas durante
os eventos, chegando a mais de 10 mil, como no caso da Feira de Informática, e a 12 mil em um evento
do Colégio São Jorge.
AR - É possível programar quantos eventos ao mesmo tempo?
MM - Nós já tivemos aqui até quatro eventos simultâneos. O auditório principal seria subdividido
para abrigar três eventos e o auditório Jorge Amado poderia abrigar outros dois, enquanto as 17
salas seriam usadas para eventos pequenos. Podemos locar as partes do Centro para eventos
diferentes, desde que um não interfira no outro. Eu diria que o Centro de Convenções talvez seja o
maior equipamento motivador para eventos de qualquer espécie, seja de turismo, comercial ou de
negócios.
AR - O senhor acredita que o turismo de eventos tem potencial para sustentar a cidade na baixa
estação?
MM - O principal nós temos, que são as condições necessárias para o turismo de eventos. Ilhéus hoje
tem um equipamento que a possibilita de receber qualquer evento de nível nacional ou internacional.
Mesmo sem trabalhar com nossa capacidade total, o comércio da cidade tem sido muito beneficiado;
imagine quando estivermos trabalhando com essa capacidade. Além disso tem o Convention Bureau, que
vai para outras regiões buscar os eventos para o Centro.
AR - E qual é a importância do Convention Bureau para a atividade turística?
MM - O Convention Bureau, de que fazem parte várias entidades municipais e estaduais, funciona
paralelamente à administração do Centro de Convenções. O pessoal administrativo do Centro é
estático, pronto para receber um evento a qualquer momento, enquanto o Convention Bureau trabalha
também outras regiões no sentido de vender Ilhéus como destino. É um trabalho demorado, que envolve
uma série de fatores independentes da administração do Centro.
AR - O senhor acha que Ilhéus oferece poucas opções de lazer?
MM - Ilhéus é muito carente nesse ponto. As pessoas que vêm à cidade para algum evento também querem
sair, sentar num barzinho, ir a boates, bons restaurantes, teatro, cinema, e principalmente querem
ser bem tratadas. Como a primeira impressão é a que fica, se essas pessoas não forem bem tratadas
nesses lugares elas levam daqui essa má impressão e passam isso para outras pessoas. É o chamado o
efeito bola de neve que pode contaminar a cidade toda.