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10 de Novembro de 2007

Abelardo Oliveira, presidente da Embasa

"Entramos com mandado de segurança"
contra a venda da Emasa, para assegurar o cumprimento de contrato de comodato entre as duas empresas, que tem validade até 2009. É o que diz o presidente da Embasa Abelardo Oliveira, que esteve em Itabuna.
      Abelardo disse que a concessão da Emasa “é uma temeridade e está cheia de irregularidades”, desrespeitando diversos dispositivos da Lei de Saneamento Ambiental, que disciplina o saneamento e o processo de concessão.
      O serviço de água e esgoto de Itabuna foi municipalizado em 1989 e a estadual Embasa cedeu diversos equipamentos de captação e distribuição de água para a Emasa, até 2009.
      O presidente da Embasa, ex-presidente da Frente pelo Saneamento e ex-secretário Nacional de Saneamento Ambiental do Ministério das Cidades entre 2003 e janeiro de 2007, concedeu entrevista exclusiva ao A Região.

A Região - Como o sr. analisa a proposta do prefeito em fazer a privatização?
       O processo inteiro é uma temeridade. O prefeito (Fernando Gomes) lançou edital baseado numa lei revogada pela Câmara e não cumpriu as exigências da Lei Nacional de Saneamento Básico. Ela, em seu artigo 11, prevê diversas obrigações antes de realizar qualquer processo de concessão de serviços públicos ou qualquer delegação, mesmo para o estado.

AR - O que o município deixou de fazer neste processo?
       Ele teria que ter instituído um plano municipal de saneamento. E não é qualquer plano. Para elaborá-lo, precisa ter audiências e consultas públicas com participação expressiva da sociedade. Também deveria instituir as normas de regulação e fiscalização dos serviços, instituir órgãos de controle social e, uma coisa que afeta a própria Embasa, teria que fazer uma avaliação econômico-financeira antes de tomar a decisão.

AR - O sr. está afirmando que não houve essa avaliação?
       Exatamente. Foi feito um diagnóstico apenas em 2000. E se constatou que este débito da Emasa com a Embasa estava em R$ 16,2 milhões. Hoje, deve chegar a R$ 20 milhões. A Embasa se preocupa não apenas com os interesses da própria empresa, mas com o que poderá acontecer com a população. Nosso contrato de comodato em vigor coloca expressamente que o município não poderá delegar os serviços a terceiros, nem mesmo ao Estado.

AR - Mas o prefeito decidiu privatizar sem nem avisar a Embasa O que acha?
       A própria publicação do edital ocorreu no Diário Oficial da União, quando a lei prevê que ela se dê em jornais de circulação local e regional. Entendemos que este ato do prefeito passa por cima da Câmara de Vereadores e dos interesses da Embasa. Já entramos com um mandado de segurança para preservar os interesses da empresa estadual e o contrato de comodato.

AR - O sr. chegou a conhecer o edital e concorrência da Emasa?
       Não, eu não tive conhecimento. O que houve foram consultas de algumas empresas que ouviram falar do patrimônio da Embasa. Nós informamos que não fomos avisados. Em duas oportunidades, nós fizemos ofício ao prefeito informando do contrato e alertando para as exigências da lei. Vamos imaginar que o processo siga e tenha um vencedor. A lei coloca claramente que os contratos só têm validade se a prefeitura seguir todas as obrigações, desde o plano municipal, criação de órgãos de regulação e fiscalização, controle social à avaliação econômico-financeira. Os artigos 9, 10 e 11 da lei tratam exatamente dessa questão.

AR - Na sua avaliação, o município não cumpriu nenhuma destas exigências?
       Que eu tenha conhecimento, não. Eu ouvi falar que o município teria instituído um plano municipal de saneamento, mas ninguém conhece esse plano, ninguém sabe. A própria lei é muito clara. Um processo desses de elaboração do plano tem que envolver a sociedade, fazendo as consultas e audiências públicas. A avaliação não foi feita.

AR - Existe risco de a Emasa perder os recursos de R$ 10 milhões e do PAC?
       Na realidade, não corre o risco de perder os R$ 10 milhões para ampliar a rede de distribuição de água. Mas o município poderá ser lesado, porque pagará a dívida e o serviço vai para a iniciativa privada. Além disso, se o prefeito levar adiante este processo vai perder, sim, os recursos do PAC (Programa de Aceleração do Crescimento). São recursos do Orçamento Geral da União (OGU) e a lei não permite que sejam repassados quando houver concessão onerosa dos serviços.

AR - E hoje esta verba seria da ordem de R$ 43 milhões?
       Inicialmente, o PAC negociou a contrapartida de 15% por parte do município. O prefeito disse que não teria os mais de R$ 6 milhões de contrapartida para a liberação dos recursos e disse que somente poderia entrar com R$ 3,3 milhões (e os recursos seriam de R$ 33 milhões).

AR - Para o município seria interessante privatizar a Emasa assim mesmo?
       Acho uma temeridade abrir mão de recursos do Orçamento Geral da União (OGU), que vêm a fundo perdido, para entrar num processo de concessão privada e com tantas irregularidades. Eu não abriria mão. Não é todo dia que você encontra dinheiro a fundo perdido.

AR - O sr. chegou a ser convidado para alguma audiência pública?
       Não. Apenas ouvi falar. Quando aqui estive para uma sessão na Câmara de Vereadores, fui visitar o prefeito e dizer que o município poderia contar com nossa ajuda para ter as verbas federais. A prefeitura apresentou essa demanda de R$ 43 milhões e o governador Jaques Wagner levou o pleito ao governo federal como uma demanda do Estado.

AR - O prefeito pediu a verba do PAC e, logo depois, insistiu em privatizar...
       Olha, é difícil imaginar o que se passa na cabeça do senhor prefeito. O que eu posso dizer é que, se eu fosse prefeito, não tomaria esse caminho. Até porque, conseguir recursos do Orçamento Geral da União não é fácil mesmo.

AR - A privatização traz mais vantagens ou desvantagens?
       Tocado pelo serviço público, a água não seria vista como uma mercadoria. Nós temos um exemplo muito claro que são os reajustes de tarifa da Embasa nos últimos anos, muito abaixo dos reajustes da concessionária de energia elétrica.

AR - No Brasil, a privatização na área de saneamento traz bons exemplos?
       65 municípios fizeram concessão de água e esgoto ou parcial. Temos exemplos de serviços que funcionam e outros que são um desastre. Em Manaus (AM), o poder público vendeu a concessão por R$ 180 milhões e o grupo francês que venceu foi embora, deixou com o parceiro brasileiro e hoje Manaus tem 500 mil pessoas sem abastecimento, mais de um terço dos habitantes da cidade.

AR - O sr. teme que a população sofra uma sabotagem no abastecimento para provar o argumento?
       Eu não poderia afirmar. Mas temos uma preocupação. Mesmo a Embasa não operando o serviço, nós entendemos sua essencialidade e vemos com preocupação qualquer possibilidade da população vir a sofrer prejuízo. Para preservar esses interesses, também ingressamos com um mandado de segurança para que sejam cumpridos o contrato e a lei do Saneamento.

 

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