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8 de Maio de 2004

Janete Ruiz de Macedo, coordenadora do Cedoc da Uesc
"Preservamos a memória regional"

      
       e incentivamos a formação de novos historiadores no Sul da Bahia. A opinião é da professora Janete Ruiz de Macedo, que coordena o Centro de Documentação e Memória Regional da Uesc (Cedoc). Historiadora, pesquisadora e professora de História Antiga da Universidade Estadual de Santa Cruz (Uesc) há 25 anos, Janete é pós-graduada em História pela PUC de Minas Gerais e tem doutorado em História pela Universidade de Leon, na Espanha.
       Casada com o também professor de Economia da Uesc e ex-diretor geral da antiga Fespi, Aurélio Macedo, Janete tem quatro filhos e se diz uma das pessoas mais apaixonadas pela área em que atua. Foi ela quem lançou, entre outras, a pesquisa "Itabuna ontem e hoje". Há quase quatro anos vem desenvolvendo diversos projetos que resgatam a memória de Itabuna, Ilhéus e outras cidades regionais que formam a área de cobertura da Uesc.
       As primeiras fases do projeto beneficiou Ilhéus e rendeu o livro "Tempo, Espaço e Cultura". Em Itabuna o trabalho teve início na antiga rua das Taboquinhas, atual Barão do Rio Branco, com as construções pintadas, que foram consideradas construções irrelevantes. No local foi feito o levantamento histórico principalmente do "castelinho" do passado aos dias atuais. A seguir os principais trechos da entrevista.

A Região - No primeiro ano foi feito apenas uma pequena parte do resgate da memória de Itabuna. E no segundo ano?
       No segundo ano já há trabalhos com os bens móveis. É bom destacar que os bens patrimoniais são classificados em móveis e imóveis, que são bem poucos em Itabuna, inclusive no Iphac (Instituto do Patrimônio Histórico e Cultural da Bahia) não consta nenhum bem cultural construído em Itabuna. Estamos tentando procurar esse "alguma coisa" porque é um bem relevante para a história da cidade.

AR - Isso inclui qualquer tipo de bem antigo?
       Sim. Não importa que seja um estilo diferente ou artístico que chame a atenção. O importante é o valor que ele tem para a comunidade porque reflete a identidade da cidade e faz parte do processo construtivo do que ocorreu. Por exemplo, a casa de Firmino Alves reflete todo um processo histórico do que ocorreu na cidade. Por isso que foram escolhidos nesse primeiro ano os bens construídos. Já no segundo a gente passou para os bem móveis.

AR - Foi possível descobrir algo que pudesse resgatar a memória através de bens móveis?
       Sem dúvida. Um deles foi um carro que hoje pertence a Nilton Ramos e foi do coronel Henrique Alves. Muitos anos depois de ter sido vendido a um compadre do coronel, foi encontrado numa fazenda em estado lastimável. Nílton conseguiu resgatar e recuperar o carro e tivemos toda essa história registrada. Outro registro foi o painel do artista plástico Genaro de Carvalho, no prédio Comendador Firmino Alves (na avenida do Cinquentenário). Esse levantamento foi feito até para chamar a atenção, porque a própria comunidade não se dá conta dos bens patrimoniais que temos.

AR - O projeto também tem resgatado as histórias de ruas de Itabuna. Existem muitas que ainda lembram o passado?
       Temos algumas, mas escolhemos uma que guarda ainda uma grande quantidade de casas de períodos bem diferenciados da história de Itabuna. É a rua Duque de Caxias, que guarda três momentos diferentes. No primeiro trecho podemos ver casas construídas na década de 20. Depois, em outro trecho, já tem os estilos de 1930 e no último já vamos encontrar construções mais recentes, de 1960. Essa forma construtiva se retrata muito bem com os relatos escritos e os gerais que encontramos até agora. Essa rua já foi chamada de rua da "Garapa", depois rua "Do Lopes" e existem muitas versões para esse nome. Uma delas era de que ali existia um médico chamado Lopes e que atendia muito bem seus pacientes. No final dos anos 40 essa rua ainda era uma zona de prostíbulo.

AR - Então tem muita história para ser lembrada....
       Tem sim. O cotidiano dessa antiga rua também está sendo resgatado. Isso envolve entrevistas com moradores. Queremos saber como era a rua, como se comemoravam as festas de São João, Natal, Carnaval, enfim estamos reconstituindo o bens tangíveis, que é a forma de viver, de pensar.

AR - Professora, esse projeto é amplo e parece que só está no início...
       É. O projeto tem a duração de mais um ano, se a gente conseguir no próximo ano bolsistas como temos hoje. No próximo semestre elegeremos mais um espaço da cidade para dar continuidade. Teve um ano que trabalhamos em Santa Cruz da Vitória.

AR - Para fazer um trabalho de resgate histórico é preciso uma equipe grande, bem treinada e dinheiro, certo?
       Trabalhamos com bolsistas. Imagine um historiador que dá aula e coordena um centro, ele não tem condições de se dedicar integralmente. Com os bolsistas, é uma forma de treinamento para os estudantes, já que estamos formando novos pesquisadores, e isso é muito importante. Temos um ex-aluno bolsista que hoje é doutorando. Terminou a graduação, fez mestrado e hoje cursa o dourado na Ufba. Então esse é um dos grandes objetivos do projeto. O pesquisador está sendo formado dentro da universidade. Não temos grandes dificuldades com pesquisa.

AR - A conclusão final de cada pesquisa tem previsão de publicação?
       O primeiro a gente publicou. Os outros ainda não sei se podemos reunir todos e publicar. Por enquanto ainda não está previsto.

AR - Existem outros objetivos para o projeto de resgate de uma cidade?
       Sim, é própria conscientização. A divulgação do projeto através dos meios de comunicação é importante porque as pessoas vão despertando para a conscientização de que eles são marco de sua história, da sua memória e que ela deve ser preservada.

AR - Ainda falta muito para a conclusão desse trabalho?
       O que fizemos ainda é muito pouco. Temos grandes espaços para explorar. Gostaríamos de ir para Mutuns. Já fizemos até um diagnóstico de lá. E o que nos chamou a atenção foi a casa de fazenda de Tertuliano Guedes de Pinho, que, com as modificações dos terrenos que estão ocorrendo, como construções de uma vila popular pela prefeitura, pode sofrer algum abalo na estrutura. Alí é uma casa-fazenda referencial tanto para a história da cidade, que Tetuliano Guedes representou, como também a forma construtiva.

AR - Como a comunidade pode participar desse processo de resgate da memória cultural?
       O primeiro passo é observar os atos lesivos, como a destruição do patrimônio, procurando os meios de comunicação e a própria universidade para receber orientação de como se deve proceder e também, o que considero muito importante, é se interessar pela história da cidade. Se a gente desconhece a história, desconhece o significado de um prédio, uma casa, enfim.

AR - O Cedoc também desenvolve projetos como o Emeroteca Regional, com o banco de dados dos periódicos da região e a implantação de arquivos públicos, não?
       Temos a Emeroteca funcionando, até porque os jornais são uma boa fonte inesgotável de pesquisa e resgate. E a implantação de Arquivos Públicos é um amplo projeto que conta com a Fundação Cultural Pedro Calmon. Já temos arquivos públicos em Itabuna, Canavieiras, Ilhéus, Una, Ipiaú. É importante cada município ter seu arquivo para o planejamento e as decisões do prefeito. Depois, o cidadão precisa de um Arquivo organizando da sua vida. Quem foi funcionário, quem pagou IPTU... e a própria comunidade vai encontrar alí a história da cidade, através de leis e decretos. O arquivo municipal tem três funções: a jurídica, a administrativa e a científica. É um documento muito importante que deve ser preservado. Como toda a história de uma cidade.

 

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